LUIZ NASSIF ON LINE
QUI, 09/04/2015 - 11:50
Sugestão de Aldo Cardoso
do Blog da Milly
A democracia americana não existe mais. Estudo publicado pela Universidade de Princeton avaliou mais de 1800 novas legislações aprovadas entre 1981 e 2002 e concluiu o que era até aqui apenas uma forte sensação: os super ricos, e ninguém mais, decidem o destino do país criando leis que os beneficie – e a despeito do que quer, ou do que é melhor, para a maioria: é o que se chama de oligarquia, ou mais exatamente “oligarquia corporativa”, um sistema que concentra o poder nas mãos de uma elite milionária e é conduzido por seus interesses.
“O ponto central que emerge de nossa pesquisa”, disseram os autores Martin Gilens e Benjamin I. Page, “é que elites econômicas e grupos organizados que representam o interesse de corporações têm substancial impacto nas políticas criadas pelo governo americano, enquanto o interesse da população tem pouquíssima ou nenhuma influência”
Não é difícil perceber como o Brasil, depois de mais de uma década de políticas sociais espetaculares, começa a tomar esse caminho: os super ricos, financiado bancadas no Congresso e no Senado, dão as cartas cada dia mais e mais.
O estudo também joga luz em uma das maiores mentiras contadas ao mundo pelos Estados Unidos: a de que as guerras em que eles se metem têm o objetivo de levar a democracia para nações torturadas pelo totalitarismo. Mas o que é a oligarquia corporativa se não uma forma privada de totalitarismo? Por que, por exemplo, o sistema de espionagem sobre seus cidadãos implantado por Stálin na Russia choca até hoje, mas o sistema americano, em todos os aspectos mais controlador do que o stalinista, como revelou Snowden, é amplamente aceito? Por que o fato de o governo americano espionar seus cidadãos a rigor para fins comerciais, e trocar com as corporações informações sobre eles, não causa revolta? Por que a psicopatia de Stálin, e Mao, que assassinaram milhares e milhares, é considerada uma aberração, mas a campanha terrorista de drones de Obama (outro efeito colateral da oligarquia) que assassina inocentes em doses diárias, é aceita?
O ambientalista John Cobb, em seu livro “The Collapse of Democratic Nation States” diz que a criação dos bancos privados foi o começo do fim da democracia no mundo. “Bancos podem criar dinheiro e, assim , emprestar mais dinheiro do que eles de fato têm. Esse controle sobre a criação do dinheiro dá aos bancos controle sobre os interesses da população. Nos Estados Unidos, Wall Street toma a maioria das decisões importantes creditadas a Washington”, escreve Ellen Brown em artigo para o site truth-out citando Cobb.
O TPP, ou Trans-Pacific Partnership, talvez seja o derradeiro golpe na moribunda democracia. O acordo comercial, conduzido em segredo absoluto entre 12 nações, prevê que as mega-corporações terão oficialmente mais poder do que as nações.
O contrato, que teve partes vazadas pelo WikiLeaks, reza, entre outras coisas, que uma corte supra-nacional será criada para regular as transações e que as mega-corporações poderão processar nações e exigir indenização do contribuinte (escrevi sobre isso aqui). Se o TPP for aprovado, as mega-corporações estarão oficialmente acima das leis, e isso se refere a regulações ambientais inclusive.
Podemos seguir listando exemplos de como e por que o sistema deixou de ser democrático. Ou de como, nas palavras de Noam Chomsy, a relação entre o capitalismo existente hoje e a democracia é uma só: a contradição.
Há alguns meses o preço do petróleo no mundo despencou à metade. Nos Estados Unidos, as quatro companhias de aviação que controlam todo o mercado, e cuja maior despesa de longe é o combustível, não repassaram a economia a seus usuários e não diminuíram nem em centavos o preço das passagens — e que sirva de argumento contra aqueles que dizem que a livre competição entre empresas sempre beneficia o consumidor. Até porque está longe de ser “livre” se apenas quatro empresas (comandadas por uma dúzia de pessoas cada) comandam imperialmente um mercado que serve milhões de pessoas. E agora, claro, elas estão prestes a orgulhosamente reportar lucros estratosféricos, como contou em seu programa de rádio no dia 5 de abril o professor de economia Richard Wolff.
Os interesses de quem um sistema como esse está protegendo? O de milhões de usuários do sistema aéreo de transporte, (que, a propósito, recentemente e sem serem consultados, salvaram da falência uma dezenas de bancos privados), ou o dos poucos acionistas e diretores dessas empresas?
É assim que se concentra mais e mais dinheiro nas mãos de poucos e que a desigualdade se aprofunda. Nos Estados Unidos, essa economia idolatrada pelo pessoal da direita brasileira, 91% das ações estão na mão de 10% da população.
Outra mentira sobre a qual é preciso falar é a da suposta recuperação da economia americana.
Olhar números como o do índice de desemprego, que vem caindo, é olhar superficial e tendenciosamente. Primeiro porque a estatística não considera aqueles que simplesmente pararam de procurar um emprego, e são milhões, e depois porque mesmo os que estão empregados na verdade estão, em grandes quantidades, sub-empregados: são trabalhadores do Wall-Mart, McDonald’s, Burguer King etc, que recentemente começaram a se organizar em sindicatos e a fazer greves em busca de salários decentes e de condições de trabalho dignas.
No sul da califórnia, colhedores de morangos estão em greve há dias – uma greve ignorada pela imprensa corporativa – por receberem seis ou sete dólares por dia (por dia!) de trabalho, debaixo do sol e de temperaturas altíssimas, sem condições de higiene e sem alimentação adequada, como já reportado por inúmeras instituições humanitárias. Já a empresa para a qual trabalham, a Driscoll’s, não se cansa de reportar lucro.
Mais um exemplo da falsa recuperação: No ano passado, 1.2 milhão de moradias foram a leilão, seus donos colocados na rua por não conseguirem pagar as hipotecas. Em 2006, na iminência do estouro da bolha, foram 700 mil casas. Mas, claro, no começo do ano um apartamento foi vendido em Manhattan por 100 milhões de dólares (350 milhões de reais), a transação imobiliária mais cara da história do Estado de Nova York. São cenários que ajudam a mostrar como o sistema está doente.
Diante do atual estado de coisas acho que ate Adam Smith, o rock-star dos neoliberais, admitiria que o capitalismo estrangulou. Nas palavras de Smith: “nações que não conseguem distribuir riqueza não são players no poder global”. Ou, nas do escritor e jornalista americano Nathan Schneider: “Nenhuma forma de legislação pode ser legítima se ela não ajuda minorias e os menos privilegiados”.
Aqui o estudo feito pela Universidade de Princeton.
Aqui texto de Ellen Brown para o truthout.com explicando como exatamente os EUA viraram uma oligarquia.
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