Por Carmen Guerreiro
Me cansei de ouvir de pais e avós orgulhosos que “as crianças hoje em dia sabem mexer em celulares e tablets desde muito cedo”. Quem não para para pensar nesta bobagem pode acabar balançando a cabeça, só para estimular a conversa. Naturalmente, adultos que cresceram usando outras tecnologias e tiveram que aprender a mexer em tablets e smartphones depois de mais velhos podem estranhar e encontrar mais dificuldades para dominar os “bichinhos”. Em geral, quanto mais velha é a pessoa e a mais mudanças ela assistiu, maior a dificuldade de se adaptar a uma nova criação.
Ao mesmo tempo, a capacidade humana de aprender é muito maior na infância do que na maturidade: basta você colocar uma criança de 5 anos e outra de 40 para dançar ballet pela primeira vez e observar quem se desenvolve mais rapidamente.
As crianças são um livro (HD, se preferir) em branco, e descobrem como mexer em um tablet da mesma forma que entendem como funciona um chuveiro, um carro, uma televisão, a natureza. Ainda mais se pensarmos que os aparelhos atuais são de uso cada vez mais intuitivo e com menos botões, não é uma grande surpresa observar como as crianças aprendem a dominá-los rapidamente. Mas, como bem disse uma amiga minha, poucos acham que uma criança é um gênio quando se apropria e sabe “navegar” um livro, mas acham que estão na frente do próximo Steve Jobs quando ela mexe sozinha em um aplicativo do iPad.
Para de fato entender a questão, basta pensarmos que os talheres são também uma tecnologia. São uma tecnologia muito antiga, é fato, mas isso não lhes tira o título. Hoje, uma criança aprende a segurar uma colher quando ainda é bebê e, no segundo ano de vida, já é capaz de comer com o talher sozinha. Mas isso não parece incrível para os adultos, pois eles já nasceram quando os talheres eram algo totalmente normal. Agora imaginem um adulto há muitos e muitos séculos sendo introduzido aos talheres depois de velho?
Minha conclusão a partir disso é que só nos impressionamos com as tecnologias que as crianças dominam desde cedo quando estas surgiram depois do nosso nascimento. Quanto mais velhos somos quando a criação foi feita, mais surpresos ficamos com a maestria infantil.
Mas você já parou para pensar na quantidade de tecnologias que você conheceu durante a sua vida e que hoje são obsoletas? Como as crianças reagiriam a isso? Com a mesma curiosidade que observam um tablet pela primeira vez, com a diferença que você não ficaria tão surpreso quando ela dominasse o aparelho. A única semelhança é que, não importa se você vê uma criança mexendo em algo antigo que você um dia já carregou por aí como a última sensação ou se as observa dando show em uma tecnologia que você ainda está descobrindo, você se sente velho.
Para mim, a solução para isso – por mais piegas que soe – é tentarmos redescobrir a curiosidade e criatividade infantil em nós mesmos. Acho que, ainda que existam obstáculos do corpo físico, muitas pessoas com o tempo se cansam de aprender, de acompanhar mudanças, de tentar entender algo novo, de se surpreender, de ouvir e considerar um novo ponto de vista. Mas, ironicamente, se encantam e se emocionam com as mesmas habilidades nas crianças.
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