domingo, 13 de março de 2016
Publicado por Zonacurva × 13/03/2014
Em 13 de março de 1964, o presidente João Goulart reuniu 150 mil pessoas no Comício da Central do Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, em prol das chamadas reformas de base de seu governo. Carlos Lacerda, governador da Guanabara e um dos principais opositores de Jango, teve a ideia de decretar feriado no dia 13 de março acreditando que, com isso, os trabalhadores não iriam ao comício. A tentativa não deu resultado.
Organizado por uma comissão de líderes sindicais, o comício mostrou aos opositores o apoio popular às reformas propostas pelo governo, que pretendiam modernizar a estrutura do país em vários setores como o agrário, bancário, administrativo e eleitoral.
Goulart discursou por quase uma hora. No início, atacou os “democratas” e sua “democracia anti-povo e anti-reforma”. Jango os acusou de defender “uma democracia dos monopólios nacionais e internacionais”. Mais adiante, ele propôs a revisão da Constituição de 1946, “que legaliza uma estrutura socioeconômica já superada” e a necessidade de “colocar fim aos privilégios de uma minoria”. Jango defendeu também a extensão do direito de voto aos analfabetos, soldados, marinheiros e cabos, assim como a elegibilidade para todos os eleitores.
Escute trecho do discurso de Jango:
Quinze oradores precederam o presidente da República. O mais aplaudido foi Leonel Brizola, ex-governador do Rio Grande do Sul e deputado federal pelo PTB carioca, que exortou o presidente a “abandonar a política de conciliação” e instalar “uma Assembleia Constituinte com vistas à criação de um Congresso popular, composto de camponeses, operários, sargentos, oficiais nacionalistas e homens autenticamente populares”.
As propostas que levaram a elite brasileira ao desespero
As propostas de Jango mexiam em interesses poderosos e arraigados há séculos no país. Entre elas, o presidente pretendia desapropriar terras com mais de 600 hectares, além de áreas que ladeavam rodovias e ferrovias nacionais. Para realizar uma reforma educacional, o governo utilizaria 15% da receita tributária brasileira. Entre os projetos nessa área, constava uma ampla reforma de erradicação do analfabetismo, baseada nas experiências pioneiras do educador Paulo Freire.
Na economia, Jango propunha um controle da remessa de lucros das empresas multinacionais para o exterior e o imposto de renda seria proporcional ao lucro pessoal. Com relação à Petrobrás, afirmou que assinara pouco antes o decreto de encampação de todas as refinarias particulares, que passavam a pertencer ao patrimônio nacional.
O discurso de Brizola preparou os presentes para o histórico discurso de Jango (fonte: site Brasil Recente)
” A reforma agrária é também uma imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para sobreviver. Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas populações mais pobres vestem farrapos e andam descalças , porque não têm dinheiro para comprar… (A reforma agrária) interessa, por isso, também a todos os industriais e comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim à nossa vida social e econômica, para que o país possa progredir, em sua indústria e no bem-estar do seu povo”. (trecho do discurso de Jango)
O livro Jango, a vida e a morte no exílio, do professor Juremir Machado da Silva, descreve a entrega pessoal de Jango ao comício: “Sai exausto. Quase desmaia no carro, para desespero de Maria Thereza. Ao chegar ao palácio, amassado e sem os botões da camisa, o velho Braguinha pergunta: — Que foi que aconteceu, presidente, o senhor parece que está vindo de uma guerra. Está mesmo. Chega vitorioso. Acaba de travar a sua mais franca batalha, de peito aberto, corpo exposto aos inimigos. Essa vitória terá o seu preço. A conta chegará logo”.
Capa do jornal Última Hora, que apoiava o governo Jango
Pelo que já se sabe, a ofensiva dos setores conservadores do país não demorou a acontecer. Em 19 de março, dia de São José, considerado o padroeiro da família, milhares de paulistanos saíram às ruas na Marcha da Família com Deus pela Liberdade. O pânico incutido por quase toda a mídia (a exceção mais conhecida era o Última Hora, jornal de Samuel Wainer) na classe média contra a “ameaça vermelha” levou, duas semanas depois, ao golpe militar.
Leia a matéria da Folha (dica da jornalista e blogueira @cynaramenezes) claramente favorável sobre a marcha conservadora em São Paulo.
Fontes: livro Jango, a vida e a morte no exílio de Juremir Machado da Silva, CPDOC-FGV e Folha de São Paulo.
Sou blogueiro, jornalista e criador de conteúdo. Pai de Lorena, santista e obcecado por literatura, cinema, música e política.
Nenhum comentário:
Postar um comentário