domingo, 27 de outubro de 2013

COMO AS TELEFÔNICAS QUEREM APRISIONAR A INTERNET







Às vésperas da votação do Marco Civil, cresce pressão para quebrar neutralidade da rede. Implicaria discriminar conteúdos segundo capacidade financeira de quem os produz

Por Jonas Valente, em Carta Capital


O projeto de lei (PL), que prevê a criação do Marco Civil da Internet (2.126/2011), foi apresentado pelo governo federal como umas das principais respostas às denúncias de que o governo dos Estados Unidos teria montado um esquema de espionagem que incluiria a interceptação de dados em diversos países, inclusive no Brasil.

No entanto, a disputa em torno do PL do Marco Civil vai além das questões de espionagem. O lobby das empresas de telecomunicações – que são, inclusive, acusadas de participar do esquema de monitoramento do governo americano – pretende acabar com o modelo de Internet historicamente constituído e consolidado, sobretudo, nos acessos fixos.

Internet livre, neste caso, significa que os usuários têm direito a contratar o serviço, podendo navegar à vontade na velocidade que escolheram, sem nenhum tipo de interferência ou limitador. Essa garantia ficou conhecida como “neutralidade de rede”. Ou seja, a rede não deve dar tratamento diferenciado a ninguém.

Fazendo um paralelo com uma estrada, a operadora estaria proibida de cobrar pedágio de uns e não de outros. Pois é exatamente o que propõem as empresas de telecomunicações. Elas querem ter total controle sobre o tipo de conteúdo que trafega na Internet. Isso atenta contra uma característica fundamental da rede, coloca o poder de escolha do acesso nas mãos das operadoras e traz dois tipos de prejuízos.

O primeiro é mais direto para o usuário. Seriam criadas “classes” de clientes conforme um volume de dados, não pela velocidade. Quem usar mais (para baixar músicas, vídeos) paga mais. Os pacotes mais baratos (e mais acessíveis à grande maioria dos internautas) teriam poucos aplicativos, e-mails e acesso a sites, entre outras coisas. Seria como fazer da Internet uma TV a Cabo, você conseguiria acessar o que o seu poder aquisitivo permitir.

Além disso, a criação de “franquias de dados” poderia fazer com que as empresas de infraestrutura segurassem investimentos. Quando a rede estiver saturada, a velocidade cai. Esse modelo freia o desenvolvimento do país. Em um cenário no qual a empresa tem que assegurar o tráfego em uma velocidade contratada, sem limite de dados, ela precisa ampliar a rede para poder vender mais pacotes. Isso evita o risco de “apagões” e melhora a qualidade do serviço.

Essa mudança patrocinada pelas operadoras feriria o princípio de que o direito de escolha do que acessar é do usuário. Poderia, ainda, trazer aumento do preço dos pacotes com mais capacidade de uso. O Brasil iria na contramão do mundo, que caminha para assegurar um acesso na web cada vez maior e com mais velocidade.

O segundo prejuízo é para a democracia. As operadoras poderiam discriminar os sites, facilitando a visualização de uns em detrimento de outros. Com isso, os grandes conglomerados de mídia, que tivessem dinheiro para fazer acordos com as empresas de telecomunicação, teriam acesso “facilitado”. Por exemplo: a pessoa preferiria acessar o portal Terra, e não um blog, porque o primeiro demoraria menos tempo para baixar. Ou optaria pelo Gmail, e não por um provedor local, porque o primeiro seria mais rápido.

As empresas de telecomunicação pressionam agora o governo e os parlamentares para incluir a franquia de dados no artigo 9º do substitutivo do deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator da matéria. Querem colocar uma garantia de mercado em algo que deveria ser a carta de princípios da Internet no país. Com o modelo de negócios, ameaçam a Internet em um de seus pilares mais fundamentais. E avançam sobre o controle da rede, o que, como as denúncias de Edward Snowden já mostraram, abre espaço para a invasão da privacidade dos usuários.

Enquanto isso, a campanha ‘Banda Larga é um Direito Seu’ cobra do governo, do relator e de deputados a necessidade de assegurar a neutralidade de rede no texto que vai à votação. Uma luta difícil e que precisa do apoio de quem quer continuar a acessar a Rede Mundial de Computadores sem ter que pagar pedágios (visíveis ou não).

Quer saber como começar? Divulgue que a nossa Internet está em risco. E cobre do seu parlamentar o apoio ao Marco Civil com a neutralidade de rede.


* Jonas Valente é membro do Conselho Diretor do Intervozes e mestre em Comunicação Social.

Postado por Marcus Taboza

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