fonte: Revista Eletrônica Tempo Presente
Rede de Estudos Tempo Presente
MIRIAM MAKEBA
PERFIL: MIRIAM MAKEBA
Miriam Makeba (4/03/1932 – 10/11/2008) foi uma cantora sul-africana. Nascida em Johanesburgo, sempre apresentou gosto pela música. Começou a cantar profissionalmente em pequenos grupos como The Cuban Brothers, Manhattan Brothers e The Skylarks. Ganhou o mundo ao participar do filme antiapartheid Come back, Africa, pelo qual passou algumas semanas na Itália. Foi proibida de voltar ao seu país, em 1960, quando sua mãe falecera. Desde então, ficou exilada por trinta anos, durante os quais teve uma série de casamentos que fracassaram, sofreu com a morte de sua única filha, enfrentou pela segunda vez um câncer, foi considerada cidadã honorária de 10 países e recebeu um prêmio Grammy por seu disco em parceria com Harry Belafonte. Fluente em inglês, francês e algumas línguas locais sul-africanas, Miriam retornou do exílio no dia 10 de junho de 1990. Após 18 anos cantando ocasionalmente e atuando em causas sociais, a Mama Africa faleceu em 10 de novembro de 2008 em função de um ataque cardíaco, logo após uma apresentação na Itália.
1. Início de vida e o nascimento da filha
2. Carreira e o sucesso internacional
3. Exílio, morte da filha e casamentos fracassados
4. Fim do exílio e o retorno ao seu país
5. Morte e legado
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2. Carreira e o sucesso internacional
3. Exílio, morte da filha e casamentos fracassados
4. Fim do exílio e o retorno ao seu país
5. Morte e legado
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1. Início de vida e o nascimento da filha
Miriam Zenzi1 Makeba nasceu em Johanesburgo, em 4 de março de 1932. Seu pai, Caswell Makeba, era membro da tribo Xhosa. Já sua mãe, Christina Nomkomndelo, era uma curandeira espiritual swazi que trabalhava como empregada doméstica em Johanesburgo. Para complementar a renda familiar, ela ainda vendia uma cerveja caseira chamada umqombothi, cuja comercialização era ilegal. Por este motivo, foi condenada a seis meses de prisão.
Miriam, que na época tinha apenas 8 dias de vida, ficou com a mãe. Cinco anos mais tarde, devido à morte de Caswell, Miriam teve que ir morar com sua avó, em Pretória, enquanto sua mãe continuava a trabalhar como empregada.
Desde cedo, apresentou gosto pela música e canto, inspirando-se em artistas locais e do jazz norte-americano como Dolly Rathebe – cujas músicas mais tarde fizeram parte do repertório da sul-africana –, Billie Holiday e Ella Fitzgerald. Começou a cantar no coro da Kilmerton Training Institute, em Pretória, onde foi prontamente reconhecida por seu talento. Quando de seus 13 anos de idade, ela teria a oportunidade de cantar para o rei da Inglaterra George VI, enquanto parte do coral selecionado para saldar o nobre em sua visita à África do Sul. Todavia, uma chuva caiu, o que fez com que o monarca inglês não parasse para prestigiar a apresentação.
Quando o apartheid foi oficialmente introduzido na África do Sul, em 1948, Makeba já tinha dimensão das limitações que poderiam ser impostas sobre a carreia com a qual sonhava. Ademais, aos 16 anos, ela viu-se obrigada a deixar a escola para poder trabalhar também como empregada doméstica em lares de famílias brancas, o que a fez viver ainda mais de perto com o preconceito racial existente no país naquele período.
Um ano mais tarde, quando de seus 17 anos, ficou grávida e Bongi, sua única filha, nasceu. Logo depois, teve câncer de mama, contra o qual lutou e venceu – cura que é atribuída ao tratamento não convencional realizado por sua mãe.
O relacionamento com o pai de Bongi não durou muito porque Miriam era vítima de agressões físicas, o que a fez optar pelo divórcio. Com um bebê para sustentar, ela continuou a trabalhar como doméstica, e, quando sobrava tempo, cantava em casamentos, festas e outros eventos para ampliar a renda.
2. Carreira e o sucesso internacional
No começo da década de 50, a sul-africana juntou-se ao grupo The Cuban Brothers, mas sua carreira como cantora só passou a ser solidificada a partir de 1954, quando aderiu ao conjunto de jazz Manhattan Brothers. Com eles, Miriam realizou uma turnê que passou pelo Zimbábue e Congo.
Com seus 24 anos, Miriam gravou a música Pata Pata 2, que foi tocada em grande parte das rádios, fazendo-a conhecida na África do Sul. Apesar disto, ela quase não recolheu benefícios financeiros do sucesso do single. Anos mais tarde, em 1967, a música foi regravada nos EUA, convertendo-se em um sucesso internacional e marca maior da carreira da cantora.
No começo da década de 50, a sul-africana juntou-se ao grupo The Cuban Brothers, mas sua carreira como cantora só passou a ser solidificada a partir de 1954, quando aderiu ao conjunto de jazz Manhattan Brothers. Com eles, Miriam realizou uma turnê que passou pelo Zimbábue e Congo.
Com seus 24 anos, Miriam gravou a música Pata Pata 2, que foi tocada em grande parte das rádios, fazendo-a conhecida na África do Sul. Apesar disto, ela quase não recolheu benefícios financeiros do sucesso do single. Anos mais tarde, em 1967, a música foi regravada nos EUA, convertendo-se em um sucesso internacional e marca maior da carreira da cantora.
Makeba deixou o Manhattan Brothers para que, no ano de 1957, pudesse liderar The Skylarks3, grupo feminino composto por Abigail Kubeka, Mummy Girl Nketle, Mary Rabatobi. O conjunto fazia uma música que misturava o jazz norte-americano e tradicionais melodias da África do Sul.
No ano de 1959, Miriam representou o principal papel feminino na ópera/jazz sul-africana King Kong4, na qual conheceu o trompetista, compositor e cantor Hugh Masekela – com quem se casou mais tarde. O espetáculo estreou em 2 de fevereiro, ficando em cartaz durante oito meses com inesperado sucesso de público. Esta foi a única vez que Christina viu sua filha nos palcos.
“Em um momento da peça, eu era estrangulada e minha mãe pulou de seu assento e berrou: ‘Não. Você não sairá impune do assassinato. Você não pode fazer isso com minha filha.’ Amigos explicaram que aquilo não era real, que nós estávamos atuando. Mas ela fez um grande rebuliço. Todos estavam embaraçados. No palco, meu coração afundou.”5
Devido ao destaque que a produção sul-africana ganhou no âmbito internacional, Miriam passou a atrair olhares de pessoas do mundo do entretenimento. A fama aumentou ainda no ano de 1959, quando interpretou dois temas no documentário/drama Come Back, Africa6, uma produção antiapartheid dirigida e produzida de forma independente pelo norte-americano Lionel Rogosin. A obra foi filmada nos arredores de Johanesburgo, parte com câmeras escondidas, parte com câmeras visíveis – ocasiões nas quais a produção fingia gravar um filme sobre dança de rua.
Por se tratar de uma obra que contestava o regime sul-africano, sua exibição foi proibida no país, o que não impediu, contudo, o sucesso e reconhecimento no exterior. No 24o Festival de Cinema de Veneza, por exemplo, recebeu elogios da crítica devido ao seu impacto social.
Miriam pretendia retornar à África do Sul logo após o festival em Veneza. Todavia, pessoas envolvidas no show business ficaram encantadas com ela e logo trataram de criar oportunidades para que fosse aos Estados Unidos da América realizar algumas apresentações, o que foi aceito pela cantora.
Durante o período em que ficou em Londres esperando a permissão para entrar em território norte-americano, acabou conhecendo o vocalista Harry Belafonte, que viu naquela mulher um talento revolucionário, querendo apoiar sua carreira. Conheceu também Sonny Pillay, um cantor sul-africano de família indiana com quem se casou. O relacionamento, porém, durou apenas três meses, terminando ainda em 1959.
Uma vez nos EUA, ela apresentou-se no The Steve Allen Show. Ademais, o dono do clube noturno New York City's Village Vanguard, Max Gordon, contratou Miriam – por recomendação de Belafonte – durante o período de quatro semanas. Já na estreia, em 2 de fevereiro de 1960, ela conseguiu conquistar o público presente, misturando em seu repertório músicas sul-africanas e jazz.
Por todo o início dos anos 60, ela continuou a entusiasmar multidões através de uma série de shows com Belafonte. Uma dessas apresentações foi em homenagem ao aniversário do então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, em 1962. O evento ocorreu no Madison Square Garden. Na ocasião, abatida por um mal-estar, Miriam não foi para a festa posterior ao show. No entanto, por insistência do presidente Kennedy, “(…) Belafonte enviou o seu pessoal para me buscar. Eu voltei e cumprimentei o presidente, então retornei ao meu pequeno apartamento. Eu estava muito feliz por ter conhecido o presidente dos Estados Unidos.”7
Miriam e Belafonte ainda gravaram o álbum An Evening with Belafonte/Makeba, que acabou recebendo o Grammy Award, em 1965.
3. Exílio, morte da filha e casamentos fracassados
Quando tentou voltar à África do Sul no intuito de presenciar o enterro de sua mãe, em 1960, descobriu que seu passaporte havia sido cancelado e que o governo havia impedido sua entrada no país. Makeba dizia lembrar-se de ir à embaixada sul-africana, em Nova Iorque, para solicitar a permissão de retorno.
Quando tentou voltar à África do Sul no intuito de presenciar o enterro de sua mãe, em 1960, descobriu que seu passaporte havia sido cancelado e que o governo havia impedido sua entrada no país. Makeba dizia lembrar-se de ir à embaixada sul-africana, em Nova Iorque, para solicitar a permissão de retorno.
“O homem no balcão pegou meu passaporte. Ele não falou comigo. Ele pegou um carimbo de borracha e bateu com ele. Então ele se foi. Eu peguei meu passaporte. Estava estampado ‘Inválido’. ‘Eles fizeram isso’, eu disse a mim mesma. ‘Eles me exilaram.’”8
Após testemunhar contra o apartheid diante da Organização das Nações Unidas, em 1963, Miriam teve sua cidadania revogada e seus discos banidos no país pelo regime. Durante décadas de exílio, contudo, ela passou a se considerar cidadã do mundo, na medida em que 10 países concederam a ela cidadania honorária.
“Eu sempre quis deixar o meu lar. Eu nunca pensei que eles me impediriam de voltar. Talvez, se eu soubesse, eu nunca teria partido; é muito doloroso estar distante de tudo que você sempre conheceu. Ninguém saberá a dor do exílio até ser exilado. Não importa aonde você vá, há momentos nos quais as pessoas lhe mostrarão bondade e amor, e há momentos nos quais elas lhe farão entender que você está com elas, mas não é um delas. É quando o exílio dói.”9
O casamento com o músico exilado Hugh Masekela, que ocorreu em 1964, terminou depois de dois anos. Ademais, teve que lutar contra um novo câncer, desta vez através de métodos convencionais, quando realizou uma delicada cirurgia.
Durante o processo de separação, Belafonte ofereceu todo o suporte de que Miriam necessitava. Foi durante esse período que ele a convidou para participar da causa de Martin Luther King, quando a cantora tomou conhecimento da situação racial nos EUA, o que a deixou perplexa. Isto porque, como ela mesma afirmou certa vez, “(...) havia um apartheid lá também, sobre o qual não tínhamos conhecimento quando víamos artistas negros nos filmes.”10
Neste período, Miriam conheceu Stokely Carmichael, ativista da causa Black Power, com quem se casou no ano de 1968 – este foi seu quarto marido. Apesar de todo o sucesso que a cantora fez entre os estadunidenses, seus shows e contratos com gravadoras viram-se cancelados a partir desta nova união, pois acreditavam que o dinheiro que Miriam ganhava com sua arte poderia ser usado para financiar a luta pelos direitos dos negros. Como resultado da exclusão nos EUA, o casal mudou-se para a Guiné, onde Miriam habitou por 15 anos posteriores.
Separada de Carmichael no ano de 1973, ela continuou a realizar apresentações pelos continentes europeu, asiático e africano, lançando o aclamado disco A Promise, em 1975. Enquanto cidadã honorária da Guiné, Miriam Makeba atuou na ONU como delegada oficial, trabalho que lhe rendeu o Prêmio da Paz Dag Hammarskjöld (1986).
Em 1985, Bongi morreu durante o parto de seu filho, que também não sobreviveu. Miriam afirmava ter encontrado força nos dois netos que já tinha – Nelson Lumumba Lee e Zenzi Monique Lee –, em sua música e em sua fé na figura de Deus. O acontecido fez com que ela optasse por viver em Bruxelas, onde se casou com Bageot Bah, um executivo de uma companhia aérea, quinto e último marido de Miriam.
No ano seguinte, seu ex-marido Hugh Masekela apresentou-a ao cantor Paul Simon. Do encontro, surgiu a turnê Graceland, que ainda contava com a participação do grupo sul-africano Ladysmith Black Mambazo. Dois dos concertos foram filmados e lançados sob o título Graceland: The African Concert.11
Depois deste projeto com Simon, a Warner Bros. Records assinou com Makeba, resultando no lançamento do disco Sangoma, de 1988. O álbum reunia cânticos de cura gravados em capela, tendo sido produzido e assim intitulado para homenagear sua mãe. Foi o primeiro trabalho norte-americano da cantora desde que ela havia deixado o país com seu então marido Carmichael.
4. Fim do exílio e o retorno ao seu país
Em homenagem ao aniversário de 70 anos de Nelson Mandela, um tributo foi organizado no dia 11 de junho de 1988, no Wembley Stadium, Londres, clamando pela libertação do sul-africano12. O evento, que foi transmitido para 67 países, contabilizando um total de 600 milhões de espectadores, aumentou a pressão sobre o governo sul-africano para que libertasse Mandela.
O presidente do país Frederik Willem de Klerk anunciou, em 1990, que Nelson seria libertado rapidamente, o que de fato ocorreu em 11 de fevereiro do mesmo ano, depois de 27 anos de prisão. Frente a esta nova conjuntura que se iniciava no país, Miriam retornou do exílio no dia 10 de junho através de seu passaporte francês, um dos nove que ganhou ao longo de seu exílio
.
No ano seguinte, Makeba juntou-se a Dizzy Gillespie, Nina Simone e Masekela para gravar e lançar o álbum Eyes on Tomorrow, que combinava jazz, R&B, pop e música africana. No intuito de divulgar o trabalho, a cantora partiu em turnê com Gillespie ao redor do mundo.13
No ano seguinte, Makeba juntou-se a Dizzy Gillespie, Nina Simone e Masekela para gravar e lançar o álbum Eyes on Tomorrow, que combinava jazz, R&B, pop e música africana. No intuito de divulgar o trabalho, a cantora partiu em turnê com Gillespie ao redor do mundo.13
Em 16 de outubro de 1999, Miriam foi nomeada Embaixadora da Boa Vontade da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Três meses mais tarde, outro reconhecimento internacional: seu disco Homeland foi indicado para o Grammy de Melhor Álbum Musical de World Music. O trabalho reunia algumas de suas músicas mais conhecidas dos seus 50 anos de carreira, incluindo Pata Pata e Click Song.
5. Morte
Uma vez findado o regime do apartheid na África do Sul, no ano de 1994, Miriam encontrou novas razões para cantar, desta vez atuando em prol da epidemia de AIDS no continente africano e dos deficientes físicos. Mesmo assim, sempre recusou o título de cantora política.
“Eu não sou uma cantora política. Eu não sei o que o mundo significa. As pessoas pensam que eu, conscientemente, decidi contar ao mundo o que estava acontecendo na África do Sul. Não! Eu estava cantando sobre minha vida, e na África do Sul nós sempre cantamos aquilo que está acontecendo conosco – especialmente coisas que nos machucam.”14
Após décadas de ativa carreira, Miriam decidiu, em 2005, que era hora de se aposentar. Desde então, ela continuou a cantar ocasionalmente, voltando seus esforços no intuito de servir como divulgadora da cultura africana. Ela também trabalhou como Embaixadora da Boa Vontade da ONU para a África do Sul. “Eu guardei minha cultura. Eu guardei a música das minhas raízes. Através de minha música, eu me tornei a voz e imagem da África e dessas pessoas sem nem mesmo perceber.”15
Apesar de doente, Miriam Makeba quis participar do concerto organizado pelo jovem escritor italiano Roberto Saviano, no dia 9 de novembro de 2008, em Castel Volturno, Itália. O evento foi produzido no intuito de chamar a atenção do mundo para a ilegalidade e força das ações da Camorra, máfia italiana que passou a ameaçar de morte Saviano após o lançamento de seu livro Gamorra, que dissecava o funcionamento do grupo. Makeba, contudo, não participou apenas em prol do autor, mas também dos seis imigrantes africanos mortos em um ataque realizado pela máfia em um bar de Castel Volturno.
Após cantar por mais de meia-hora no evento, Miriam sentiu-se mal e foi levada para a clínica Pineta Grande, onde, ainda nas primeiras horas do dia 10, sofreu um ataque cardíaco que causou sua morte. A cantora tinha 76 anos de idade.
Discografia:
Miriam Makeba – 1960
The World of Miriam Makeba – 1962
Makeba – 1963
Makeba Sings – 1965
An Evening With Belafonte/Makeba – 1965
The Click Song – 1965
All About Makeba – 1966
Malaisha – 1966
Pata Pata – 1967
The Promise – 1974
Country Girl – 1975
Sangoma – 1988
Welela – 1989
Eyes On Tomorrow – 1991
Sing Me A Song – 1993
A Promise – 1994
Live From Paris & Conakry – 1998
Homeland – 2000
Keep Me In Mind – 2002
Reflections – 2004
Miriam Makeba – 1960
The World of Miriam Makeba – 1962
Makeba – 1963
Makeba Sings – 1965
An Evening With Belafonte/Makeba – 1965
The Click Song – 1965
All About Makeba – 1966
Malaisha – 1966
Pata Pata – 1967
The Promise – 1974
Country Girl – 1975
Sangoma – 1988
Welela – 1989
Eyes On Tomorrow – 1991
Sing Me A Song – 1993
A Promise – 1994
Live From Paris & Conakry – 1998
Homeland – 2000
Keep Me In Mind – 2002
Reflections – 2004
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