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O Brasil tem US$ 300 milhões
bloqueados em contas de brasileiros no exterior e, deste total, US$ 166 milhões
estão na Suíça. Segundo o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação
Jurídica Internacional, do Ministério da Justiça, a maior parte dos recursos
bloqueados está vinculada a investigações de corrupção no Brasil, e não ao crime
de tráfico de drogas, outra origem de remessas ilegais ao exterior. A Suíça é o
país com maior volume de dinheiro, seguido pelos Estados Unidos, e é o principal
destino de depósitos investigados nos inquéritos que sobre corrupção no setor
metroferroviário paulista.
O Ministério Público da Confederação Suíça
(MPC) já confirmou o bloqueio de US$ 6,5 milhões de Jorge Fagali Neto, irmão do
ex-presidente do Metro José Jorge Fagali, e quase US$ 1 milhão de Robson
Marinho, conselheiro do Tribunal de Conta do Estado (TCE). Também foram
bloqueados recursos em nome de João Roberto Zaniboni. Investigações em curso no
Brasil indicam que ele teria recebido, pelo menos, US$ 836 mil (cerca de R$ 1,9
milhão) na conta denominada Milmar, no Credit Suisse, entre 1999 e 2003, durante
o período em que estava na estatal paulista e assinou contratos com a
Alstom.
A juíza Maria Gabriela Pavlópoulos Spaolonzi,
da 13ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, determinou a expedição de carta
rogatória à Suíça para pedir cópia de documentos das contas de Robson Marinho,
José Geraldo Villas Boas, Sabino Indelicato e de Jorge Fagali Neto, entre
outros. Os promotores Silvio Marques e José Carlos Blat aguardam decisão do
Tribunal Federal suíço para liberação dos documentos das contas dos
investigados.
- No caso da corrupção, o centro das
investigações é localizar o dinheiro e fazer com que ele retorne aos cofres
públicos - afirma Ricardo Saadi, diretor do Departamento de Recuperação de
Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), do Ministério da
Justiça.
Segundo Saadi, nos últimos três anos o Brasil
identificou R$ 20 bilhões em recursos de origem ilícita, a maioria, de crimes de
corrupção. O levantamento faz parte do cruzamento de informações da rede de 35
unidades do Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD),
instaladas em todo o país.
Dinheiro só é repatriado após sentença final
contra o acusado
Apesar da quantidade de recursos bloqueados no
exterior, a Suíça, assim como os demais países, só repatriam o dinheiro quando
há sentença final contra o acusado - ou seja, o processo tem de ter sido
transitado em julgado, ou seja, sem possibilidade de recursos. Nos últimos três
anos, o Brasil conseguiu receber apenas R$ 39 milhões e, segundo Saadi, o
repatriamento só ocorreu porque o julgamento foi encerrado nos outros países,
não no Brasil.
Foi o caso, por exemplo, dos US$ 4,8 milhões
(cerca de R$ 11,1 milhões) que estavam congelados na Suíça em nome do ex-juiz
Nicolau dos Santos Neto, acusado e condenado por corrupção e desvio de verbas na
construção do Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo.
- No caso do juiz Nicolau, o julgamento acabou
lá na Suíça. Eles devolveram por livre e espontânea vontade e foi isso que
ocorreu com a maioria dos recursos que retornaram nos últimos três anos -
observa Saadi.
No mês passado, foi descoberto parado no Brasil
um pedido da Suíça para ouvir quatro envolvidos no caso Alstom, de pagamento de
propina, superfaturamento e cartel nas licitações do metrô e trens de São Paulo.
Entre os que deveriam ser ouvidos estavam Zaniboni, além de consultores
suspeitos de intermediar o pagamento de propinas da Alstom - Arthur Teixeira e
José Amaro Pinto Ramos. O Ministério Público Federal em São Paulo afirmou que
houve falha administrativa e que o pedido da Suíça teria sido arquivado numa
pasta errada. A conduta do procurador Rodrigo de Grandis, responsável pelo caso,
está sendo investigada pela Corregedoria do Conselho Nacional do Ministério
Público (CNMP).
- Estamos conscientizando as autoridades sobre
a necessidade de andamento mais rápido dos processos. A demora causa descrédito
em relação ao Brasil e dificulta novos pedidos de bloqueio - explica
Saadi.
Grupo impõe a países regras para facilitar
acesso a dados bancários
A investigação e o rastreamento de dinheiro
fruto de corrupção no mundo foi facilitada com o fortalecimento do Grupo de Ação
Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e Combate ao Financiamento do Terrorismo
(GAFI), que impõe a países e instituições financeiras regras para facilitar o
acesso a informações bancárias relativas ao fluxo ilegal de recursos no mercado
financeiro mundial.
Segundo estudo da Fundação Alexandre de Gusmão,
vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, a Convenção Interamericana
contra a Corrupção, assinada em 1996, foi o primeiro instrumento internacional a
abordar a corrupção transnacional propriamente dita. "Num ambiente econômico
crescentemente globalizado, as empresas norte-americanas encontravam-se em
desvantagem, em relação a concorrentes estrangeiras que recorriam a subornos
para ter acesso a mercados e contratos públicos", diz o estudo.
A perda de competitividade levou os Estados
Unidos a exercerem forte pressão em prol da governança corporativa e de regras
de compliance no mundo. Em 2000, foi publicada a primeira lista com os chamados
"paraísos fiscais", que poderiam ser alvo de sanções. Após o atentado de 11 de
setembro, os Estados Unidos passaram a cobrar também maior transparência do
mercado financeiro mundial, a fim de rastrear dinheiro destinado a financiar
operações terroristas. Países que não se adequaram imediatamente, como Ilhas
Seychelles, Ilhas Cook e Myanmar, sofreram esvaziamento de seus mercados
financeiros. Até mesmo a Áustria, membro fundador do GAFI, foi alvo da
instituição por não eliminar contas anônimas de poupança. O objetivo é
identificar os reais donos das contas correntes no mundo todo e evitar que o
sigilo bancário seja usado para barrar investigações.
Em 2009, o governo suíço se comprometeu a
informar aos Estados Unidos os dados de contas bancárias de clientes americanos
envolvidos em fraude contra o Fisco. A Justiça americana chegou a ameaçar bancos
suíços com a perda de licença de operação.
Cleide Carvalho
O Globo
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