quinta-feira, 10 de abril de 2014

QUEM LEMBRA DE JOHNNY ALF? ELE CONTINUA CULT

 Por: Tamára Baranov


Johnny Alf (Alfredo José da Silva)
(Rio de Janeiro, 19 de maio de 1929 – Santo André, 04 de março de 2010)

Alfredo José da Silva, era este o seu nome, nasceu no Rio de Janeiro e morreu em São Paulo, no dia 4 de março de 2010. Ele tinha 80 anos e vivia numa casa de repouso em Santo André. Durante o tempo em que esteve internado, Johnny Alf integrou o coral de cordas e vozes do hospital. Dois anos antes de sua morte, ele foi homenageado pelo grupo quando da comemoração dos 50 anos da bossa nova que ele iniciou na década de 1950 com seu piano e muito swing, de boate em boate, de bar em bar. No bar do hotel Plaza, na Avenida Princesa Isabel, Johnny Alf tocava a música mágica e encantava novatos e profissionais. Para entender aquela harmonia tão diferente ficavam à sua volta, Sylvinha Telles, Carlinhos Lyra, Roberto Menescal, Nara leão. Também fascinados, os profissionais, Tom Jobim, Lucio Alves, João Donato, Billy Blanco, Dolores Duran, Claudete Soares e quietinho num canto, garoto ainda, o baiano João Gilberto. Os músicos o adoravam, Johnny era cult. E quando Johnny Alf veio para São Paulo inaugurar uma casa noturna, ‘A Baiúca’, a bossa nova que ele iniciou inundava o Rio.

‘Meu homossexualismo interfere como nuance que evidencia e policia meu comportamento junto às pessoas. É ele a brisa do título da música, é ele o devaneio que inspirou a letra. Analise a letra e terás a sacação. Prá um artista, o motivo de certas obras fica incrustado na pedra fundamental de sua personalidade e com bastante inteligência ele usa esse motivo num teor de simplicidade honesta, sem se revelar aos outros se é isso ou aquilo! A arte o faz.’ (O trecho, que revela a sua orientação sexual, é de uma carta de Johnny Alf, datada de 1986, e publicada na biografia ‘Johnny Alf – Duas ou três coisas que você não sabe’, de João Carlos Rodrigues)

‘Ele foi um dos precursores da linguagem da Bossa Nova. Algumas de suas músicas compostas na década de 50, como ‘Céu e Mar’ e ‘Rapaz de Bem’ (ambas de 1953) chamam a atenção pela melodia e harmonia modernas e revolucionárias para a época. A melodia de ‘Céu e Mar’ é composta de intervalos de quartas justas, o que não era usual, e mostra um pensamento melódico / harmônico arrojado, e uma enorme afinidade com o jazz, que também nessa época explorava o pensamento modal e a harmonia construída em quartas (em vez da tradicional construção em terças maiores e menores). O Jazz sem dúvida influenciou muito a linguagem musical de Johnny Alf. Suas harmonias são cheias de tensão, de acordes dissonantes; o seu jeito de tocar piano tem muito ‘swing’ e suas canções se prestam perfeitamente a arranjos instrumentais e à improvisação, pois são ricas tanto em termos melódicos como harmônicos.’ (Mariô Rebouças, pianista)

Trecho do documentário ‘Coisa Mais Linda – Histórias e Casos da Bossa Nova’ (2005) de Paulo Thiago que enfoca Johnny Alf. O documentário mostra um painel histórico, musical e informativo sobre o nascimento da Bossa Nova, nos anos 50.

Johnny Alf era classe A, mas viveu no lado B

Avesso à badalação, trocou o Rio por SP e se tornou um dissidente, ficando fora da panela da bossa nova.

Por Lauro Lisboa Garcia, de O Estado de S. Paulo

Caso típico de gênio cult subestimado pelo gosto popular, Alf, como a história da bossa nova, não parou nunca. E mesmo produzindo pouco, não se deteve no pedestal de pioneiro. Embora escassa, sua discografia é registro insuspeito de que esteve aberto às transformações de cada época (no disco Desbunde Total gravou até balada pop), sem perder a linha; e suas influências, tão notáveis, não permitem que sua fama seja reduzida à de precursor da bossa nova, mas um de seus motores constantes. Jamais deixou de soar moderno e estimulante. Está aí Mais Um Som, para quem quiser comprovar.

Com o pseudônimo de apelo internacional e o estilo sofisticado que namorava com o cool jazz, Alf poderia ter-se lançado à fama nos Estados Unidos – como o fizeram Sergio Mendes, Astrud Gilberto, Laurindo de Almeida, Moacir Santos, Eumir Deodato e Antonio Carlos Jobim. Isto se tivesse pelo menos aceitado o convite do compositor Chico Feitosa para se apresentar no Carnegie Hall, em Nova York, no evento que consolidou o sucesso da bossa nova no exterior, em 1962. Preferiu ficar no Rio.

Alf era classe A, mas viveu no lado B da bossa nova. “Ele não estourou porque chegou cedo demais”, afirmou Roberto Menescal. Conta ponto também o fato de Alf ser avesso a badalação e o fato de ter trocado o Rio por São Paulo o fez situar-se como dissidente, ficando fora da panela da bossa nova em sua eclosão. “O que eu faço não é bossa nova, mas samba jazz”, desconversou certa vez.

Alf era tímido, muito discreto e modesto. “Posso dizer que fiz alguma coisa um pouco antes do resto do pessoal”, disse. Suas melodias e letras até meados dos anos 1960 eram carregadas de melancolia noturna: nada de barquinhos, manhãs de luz e tardinhas de cartão postal. O estilo de vida de então e, paralelamente o de sua música, destoava do padrão ensolarado de seus pares cariocas. Não estranha que tenha trocado a beira-mar pela então fria capital paulista, desestimulado que se sentia na terra da Garota de Ipanema. “Sempre estive afastado da patota, porque sou muito desconfiado das pessoas. Os problemas que tive na vida me criaram dificuldade de relacionamento. Em meio de grupinho, nunca estava seguro.”

Tampouco surpreende o fato de que Ilusão à Toa, composta nos pouco liberais anos 50, seja considerada uma canção de amor gay enrustido. Uma das que vêem a letra por esse ângulo é a cantora Leila Maria, que lançou em 2007 um álbum temático, Canções do Amor de Iguais, que inclui a canção de Alf que inspirou Um Certo Alguém (Lulu Santos/Ronaldo Bastos) e Amor Mais Que Discreto (Caetano Veloso).

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Fonte: GGN

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