Sem discutir com a comunidade, Temer envia ao Congresso projeto que fragmenta e empobrece a formação e abre caminho para a privatização
por Cida de Oliveira, da RBA publicado 22/09/2016 19:47
Jornalistas Livres
Proposta de novo ensino médio, sem resolver os velhos problemas, foi criticada nas ruas
São Paulo – O presidente Michel Temer (PMDB) e o ministro da Educação, Mendonça Filho, enviaram hoje (22) ao Congresso a Medida Provisória 84, da reforma do ensino médio. A proposta elaborada às pressas pela equipe do governo, sem consultar professores, estudantes e especialistas, está sendo duramente criticada pela comunidade e também por setores do Ministério Público Federal.
No início de setembro, quando foram divulgados os resultados da edição 2015 do Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), no qual o ensino médio da rede pública não atingiu a meta estipulada de 4,3, ficando em 3,7, o ministro anunciou que haveria a reforma.
Em comum, as críticas apontam para um modelo ultrapassado que fragmenta e empobrece a formação, que traz de volta uma concepção elitista da educação e que não contempla medidas necessárias para solucionar problemas estruturais.
O coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, avalia que o projeto é temerário. "Reúne questões perigosas, como liberar processos administrativos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação para transferência de recursos, estimula parcerias público-privadas, abre espaço para a privatização e propõe um castelo de areia com a flexibilização. Como não foi dialogado, tende a ruir", disse.
Para Cara, a reforma de Temer pode vir a não ser implementada. "Pode servir apenas para bagunçar tudo, pois quer mudar o percurso do aluno, sem melhorar questões estruturais."
A presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Andrea Gouveia, diz estar preocupada. Para ela, a proposta vai na contramão do que se discute em termos de caminhos para a melhoria do ensino médio. "Há várias possibilidades para melhorar um nível de ensino que tem o duplo desafio de ser caminho para o ensino superior e ao mesmo tempo capacitar para o mundo do trabalho. O melhor deles é melhorar a infraestrutura da escola, com laboratórios que funcionem, com internet que funcione e com professores que tenham tempo para dialogar com os alunos."
Referindo-se à fala de Temer na cerimônia, que enalteceu sua reforma como um retorno aos tempos que ele era estudante – em que se optava entre o clássico e o científico dependendo da faculdade pretendida –, Andrea destaca o viés excludente. "Da mesma maneira que antes optavam apenas os alunos da elite, que seguiriam para a faculdade, com a reforma de Temer, os filhos dos trabalhadores terão como escolha o mundo do trabalho. Nem podemos dizer que isso seja uma escolha, mas o aprofundamento da desigualdade", disse.
Destacando o caráter autoritário da reforma, por meio de medida provisória, a presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, Camila Lanes, disse que a entidade está se reunindo para analisar e debater as consequências da reforma. No entanto, adiantou que a aparente modernidade e eficiência da proposta é falsa. "À primeira vista, parece interessante, que permite ao aluno escolher o que seguir. Mas configura um modelo de ensino com 'olhar mecânico', que deverá reduzir carga horária de disciplinas fundamentais para o desenvolvimento do pensamento. Sem contar que não resolve problemas que temos hoje, como falta de merenda."
Para a secundarista, há ainda o componente excludente da reforma. "Pode haver aumento da evasão já que será estimulado o ensino em tempo integral, quando muitos estudantes precisam estudar à noite para trabalhar."
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, também se manifestou. Em nota divulgada segunda-feira (19), a procuradoria afirmou ser temerária a utilização de medida provisória no tratamento de tema sensível e complexo. "As mudanças a serem implementadas em um sistema que envolve 28 redes públicas de ensino (União, Estados e Distrito Federal) e ampla rede privada precisam de estabilidade e segurança jurídica, o que o instrumento da medida provisória não pode conferir, uma vez que fica sujeito a alterações em curto espaço de tempo pelo Congresso Nacional."
Ainda segundo a nota, "por se tratar de tema que envolve milhares de instituições públicas e privadas, centenas de organizações da sociedade civil e milhões de profissionais, imaginar que um governo pode, sozinho, apresentar uma solução pronta e definitiva é uma ilusão incompatível com o regime democrático. Mais que inefetiva, a apresentação de soluções fáceis para problemas complexos é um erro perigoso."
No início de setembro, quando foram divulgados os resultados da edição 2015 do Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), no qual o ensino médio da rede pública não atingiu a meta estipulada de 4,3, ficando em 3,7, o ministro anunciou que haveria a reforma.
Em comum, as críticas apontam para um modelo ultrapassado que fragmenta e empobrece a formação, que traz de volta uma concepção elitista da educação e que não contempla medidas necessárias para solucionar problemas estruturais.
O coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, avalia que o projeto é temerário. "Reúne questões perigosas, como liberar processos administrativos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação para transferência de recursos, estimula parcerias público-privadas, abre espaço para a privatização e propõe um castelo de areia com a flexibilização. Como não foi dialogado, tende a ruir", disse.
Para Cara, a reforma de Temer pode vir a não ser implementada. "Pode servir apenas para bagunçar tudo, pois quer mudar o percurso do aluno, sem melhorar questões estruturais."
A presidenta da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Andrea Gouveia, diz estar preocupada. Para ela, a proposta vai na contramão do que se discute em termos de caminhos para a melhoria do ensino médio. "Há várias possibilidades para melhorar um nível de ensino que tem o duplo desafio de ser caminho para o ensino superior e ao mesmo tempo capacitar para o mundo do trabalho. O melhor deles é melhorar a infraestrutura da escola, com laboratórios que funcionem, com internet que funcione e com professores que tenham tempo para dialogar com os alunos."
Referindo-se à fala de Temer na cerimônia, que enalteceu sua reforma como um retorno aos tempos que ele era estudante – em que se optava entre o clássico e o científico dependendo da faculdade pretendida –, Andrea destaca o viés excludente. "Da mesma maneira que antes optavam apenas os alunos da elite, que seguiriam para a faculdade, com a reforma de Temer, os filhos dos trabalhadores terão como escolha o mundo do trabalho. Nem podemos dizer que isso seja uma escolha, mas o aprofundamento da desigualdade", disse.
Destacando o caráter autoritário da reforma, por meio de medida provisória, a presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, Camila Lanes, disse que a entidade está se reunindo para analisar e debater as consequências da reforma. No entanto, adiantou que a aparente modernidade e eficiência da proposta é falsa. "À primeira vista, parece interessante, que permite ao aluno escolher o que seguir. Mas configura um modelo de ensino com 'olhar mecânico', que deverá reduzir carga horária de disciplinas fundamentais para o desenvolvimento do pensamento. Sem contar que não resolve problemas que temos hoje, como falta de merenda."
Para a secundarista, há ainda o componente excludente da reforma. "Pode haver aumento da evasão já que será estimulado o ensino em tempo integral, quando muitos estudantes precisam estudar à noite para trabalhar."
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, também se manifestou. Em nota divulgada segunda-feira (19), a procuradoria afirmou ser temerária a utilização de medida provisória no tratamento de tema sensível e complexo. "As mudanças a serem implementadas em um sistema que envolve 28 redes públicas de ensino (União, Estados e Distrito Federal) e ampla rede privada precisam de estabilidade e segurança jurídica, o que o instrumento da medida provisória não pode conferir, uma vez que fica sujeito a alterações em curto espaço de tempo pelo Congresso Nacional."
Ainda segundo a nota, "por se tratar de tema que envolve milhares de instituições públicas e privadas, centenas de organizações da sociedade civil e milhões de profissionais, imaginar que um governo pode, sozinho, apresentar uma solução pronta e definitiva é uma ilusão incompatível com o regime democrático. Mais que inefetiva, a apresentação de soluções fáceis para problemas complexos é um erro perigoso."
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