REVISTA MAQUIAVEL
Sara Mariel
pele parda e ouço funk.
PUBLICADO NO BLOGGER POR MARISTELA FARIAS, NEGRA, NÃO USO TURBANTE, FAÇO O QUE QUERO DE MEU CABELO, TENHO 72 ANOS, OUÇO FUNK, REGGAE, JAZZ, BLUES ÓTIMA MÚSICA BRASILLEIRA E JÁ AGUENTEI PAULEIRA E AINDA AGUENTO POR SER NEGRA.
Lembro-me como se fosse ontem a felicidade que senti ao descobrir minha origem. A vida toda fui questionada sobre meus olhos pequenos e puxados, como de asiáticos, mas a pele escura como aponta minha descendência de pessoas escravizadas, e eu nunca soube explicar o porque de ter a aparência que tenho.
Sabemos que pessoas brancas tem maior facilidade em compreender sua origem, o avô italiano, a avó portuguesa, aquele bisavô que veio refugiado da segunda guerra mundial, enquanto nós, negros brasileiros, ficamos apenas com o discurso de povos vindos da África. Mas que África? Qual cultura nos representa? A língua usada pelo nossos ancestrais era mesmo o Yorubá? A religião que contemplou nossos parentes mais distantes era o candomblé?
Eu vim de uma família de pessoas negras, todas com pele clara, que eu sempre associei a miscigenação, nunca, em momento algum, eu pensei que poderia ser uma descendência de uma tribo específica da África onde os povos tem na sua genética a pele clara – afinal, sempre relacionamos o ser africano a uma pele escura, quando a África é um continente enorme e com diversos fenótipos – e no conforto de acreditar que havia uma mistura de brancos e negros, nunca pesquisei a minha origem.
Um dia, estava em um debate caloroso com meu pai, um historiador de 65 anos, um homem negro que se formou na universidade aos 63, um exemplo para mim, alguém que sinto uma profunda admiração. O tema era apropriação cultural. Reclamei de como me incomodava ver mulheres brancas e cristãs se apropriarem do turbante como um acessório, adereço para fetiche da cultura negra. Ele me fitou por longos minutos até que me perguntou
Você acha que tem direito a usar turbante?
Eu respondi que sim, sem nem pensar muito sobre o assunto. Eu era negra, minha origem era africana, meus antepassados eram escravos, eu, mais do que ninguém, tinha o direito e o dever de usar turbantes. Ele riu. Me lembro desse momento nitidamente até hoje.
A tua origem não é a que pensa que é.
Ele disse assim, a seco, frio, e um nó surgiu na minha cabeça. Se minha origem não era africana, então o que diabos era eu?
Ele me explicou, disse que em sua pesquisa descobrirá que nossa família era de origem Moura – pelo menos, por parte de pai –, uma região de Portugal dominado por muçulmanos, que ao chegarem ao Brasil, tornarem-se católicos, não se sabe o motivo, o mais provável é de que a igreja funcionava como cartório, então para registrar um casamento ou documentação, você precisava passar por lá. E que eu, sabendo da minha origem, da minha possível linhagem, e que nada tinha a ver com a cultura do turbante, eu não teria nada de diferente de uma pessoa branca que usa algo tão simbólico como acessório e estético.
Eu entendo como é difícil descobrir nossas origens, a população negra tem sido propositalmente prejudicada, neglicenciada, e pesquisar sua origem pode muitas vezes custar caro, que o meu privilégio de saber de onde minha família veio é inquestionável, vale a reflexão. Por que eu, pessoa negra da diáspora, quero usar turbante? Qual é a minha ligação com esse símbolo? O que me diferencia da pessoa branca que acha o turbante um acessório bonito
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