Por Mirian França, no Mamapress
Filha de uma negra solteira, pobre, costureira aposentada, que jogou uma negra doutora na cara da sociedade. Uma negra que estuda e trabalha pra caralho pra garantir o direito de ser livre e viver como quiser.
Essa sou eu, MIRIAN FRANÇA, a negra encarcerada no Ceará em Dezembro de 2014 por suspeita de assassinar uma turista italiana.
Graça aos amigos e a população, a policia foi obrigada a me libertar do meu cárcere. Cárcere sim! Pois se tratando de uma prisão sem fundamentos, trata-se de uma prisão ilegal. Cometida por uma polícia despreparada e racista, que insiste em enxergar o negro como culpado mesmo quando não existem provas, evidência, motivação ou testemunha. Que insiste em dizer que têm “CONVICÇÃO” de que somos culpados mesmo quando não há nenhuma prova da nossa culpa. Se tratando dos negros a polícia se esquece do nosso direito básico de que somos inocentes até que ELES provem o contrário, não somos nós que precisamos provar nossa inocência.
Ser negra é ser chamada de estranha quando você sai de férias e passa o dia na beira da piscina lendo, porque uma negra gostar de ler “é muito contraditório, provavelmente está forjando um álibi”.
Ser negra é ser questionada sobre como teria dinheiro para tirar férias no Ceará (um estado do MEU país, onde apenas turistas estrangeiros parecem ser bem vindos). Ser negra é ter a obrigação de andar com um macho a tira colo; não poder viajar sozinha; não ter o direito de trepar com quem quiser, sem ser chamada de puta (alias, essa é a sina de todas nós mulheres).
Ser negra é ter medo de parir uma criança que já nasce como um alvo para o genocídio. Que precisa ser preparado pra violência policial, pra chacota na escola, no teatro, na vida toda.
O RACISMO no Brasil É UM CRIME PERFEITO. É o crime sem corpo, sem prova, sem testemunha. Mas é nítido quando a polícia tem “convicção de que você é culpado”, apenas com base no seu “comportamento suspeito” (Gostar de ler? Gostar de escutar musica? Gostar da introspecção? Gostar de viajar? Ser solteira?).
Não precisa chamar o negro de macaco pra ser racista não. Basta abrir os olhos e ver quem é preso por engano, basta ver quem precisa provar a inocência (quando a lei é clara que se é inocente até que se prove o contrario). Quem é assassinado nos autos de resistência nunca é um branco. Eu nunca soube de um branco preso em manifesto por portar uma garrafa de desinfetante (Daniel Braga). E nem uma branca ser arrastada por viatura policial (Claudia Ferreira).
Eu sou a prova viva de que a redução da maioridade no Brasil é pretexto pra prender criança negra. Sou prova viva de que pena de morte no Brasil é consentimento jurídico para o Estado assassinar mais negros. Eu sou a prova de que pra polícia brasileira a culpa tem cor.
(Leia mais sobre o caso de Miriam França)
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