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Estas são as Treze Avós Nativas, mulheres que se dedicam à missão de salvar o mundo
Avós Nativas – mulheres que se dedicam à missão de salvar o mundo
Déa Januzzi
Você já ouviu falar das Treze Avós Nativas que rezam pelo planeta? São mulheres anciãs, sábias, as “abuelitas” da mitologia, aquelas que sabem acender a fogueira, usam ferramentas mágicas para transformação que não mudam com o passar do tempo: a mesa da cozinha, a luz do lampião, uma única vela, as preces. A música, a intuição. A sopa, o chá e a história. A conversa, o cuidado. Elas sabem ler a alma e o coração. E no caso das Treze Avós, elas são reais. Vivem nos quatro cantos do mundo, em suas cidades, aldeias e comunidades e se uniram, em 2009, para uma tarefa árdua e desafiadora. Salvar o planeta em processo de destruição, do caos, da desordem, para as próximas sete gerações. Usando as próprias tradições, fazendo a alquimia das ervas, folhas, plantas, conhecimentos – e transitam, com familiaridade, pelos caminhos da política e da espiritualidade.
Elas têm entre 70 a 90 anos e foram convocadas a fazer a mudança que o mundo precisa, com valores ancestrais. Elas sabem nutrir o corpo e a alma dos que estão à sua volta, com simplicidade, compaixão e experiência. Vieram da Floresta Amazônica, do Círculo Ártico da América do Norte, das grandes florestas do Noroeste americano, das vastas Planícies da América do Norte, das Terras Altas da América Central, das Colinas Negras do Dakota do Sul, das Montanhas de Oaxaca, do deserto do Sudoeste Americano, das Montanhas do Tibet e da Floresta da África Ocidental.
Por incrível que pareça, elas vão se encontrar pela última vez em julho deste ano, na África, onde vive uma das avós, Bernadette Rébiénot, mestre da raiz iboga e conselheira espiritual do presidente do Gabão. Fora da África Ocidental quase ninguém conhecia essa planta, ingrediente-chave do culto religioso Bwiti. Em pouco tempo, porém, a planta ganhou fama mundial como cura milagrosa para dependentes de heroína e de outras drogas destruidoras como o crack.
Elas são como pilares que sustentam o planeta, com paciência e sabedoria. São guardiãs do planeta, têm profundo respeito pela Mãe Terra, sabem ouvir o seu clamor. São como árvores centenárias, com raízes fortes, que não deixam se abater pelos vendavais. Elas conhecem o ritmo da natureza, os sons internos, e os seus descompassos. Elas representam o bálsamo para quem sofre. E ouvem o clamor da Terra.
Desde outubro de 2009, ouço a voz delas que se espalha pelos quatro cantos do planeta. Elas fazem parte do Conselho Internacional das Avós Nativas e têm uma missão especial. Maria Alice Campos Freire, de 61 anos, é a mais nova das avós. Brasileira, viveu durante 24 anos na floresta amazônica decifrando a linguagem das plantas, arbustos e cipós, da mata virgem. Elaborou seus conhecimentos no livro “Florais da Amazônia, o renascimento da elementoterapia”. Mestre das cerimônias de umbanda da igreja do Santo Daime, no Céu do Mapiá e fundadora do Centro de Medicina da Floresta, Maria Alice trabalha ativamente na preservação da floresta e das medicinas tradicionais. De uma pequena horta, com espécies medicinais, no coração da Amazônia, na Floresta Nacional do Perus, ela partiu para a implantação de sistemas agroflorestais, plantas alimentícias e de uma unidade de processamento, a chamada Cabana de Ervas São Damião. Em pouco tempo, o CMF se transformou em referência comunitária na terapêutica da floresta, pois está baseado no uso consciente dos recursos naturais, das matérias primas regionais, da harmonia com a natureza e do estudo e observação de suas leis.
Conheci Maria Alice a avó brasileira recentemente. Ela chegou com um vestido bordado a mão. E me encantou quando abriu a maleta curativa e espalhou as cartas com a alquimia das plantas. Pediu que eu escolhesse uma de cada, as que mais me atraíssem da mata virgem, das grandes árvores, dos cipós, arbutos, epífitas e fungos. Movida por uma força magnética escolhi as que mais me chamaram a atenção. Imediatamente, ela fez os florais que eu deveria tomar para cuidar da saúde e da evolução como pessoa. Nunca me senti tão bem depois. Como se ela tivesse o dom da cura.
Como tudo começou? A ideia partiu da americana Jeneane Prevatt, responsável pela reunião do Conselho. Mais conhecida como Jyoti (“Luz” em sânscrito), Jeneane vem de uma trajetória espiritual eclética, narrada em seu livro “Um anjo chamou meu nome”, inédito em português. Pós-graduada em psicologia pelo Instituto Jung de Zurique, atravessou um processo radical de transformação praticando Kundalini Yoga com um guru indiano. Com 25% de sangue indígena sob a pele branca, passou a receber visitas do espírito de sua avó cherokee, que a levou a aproximar-se das práticas espirituais dos índios americanos. Acabou tornando-se fundadora e líder de uma comunidade internacional chamada Kayumari, ligada à Igreja Nativa Americana, que tem como sacramento o cactus psicoativo peiote.
Em 1998, ela teve uma visão. “A Mãe Divina me apareceu, anunciando que iria me entregar uma cesta sagrada, onde estavam algumas de suas joias mais preciosas. Essas joias representam linhagens de preces que remontam às nossas eras originais. ‘Não as misture, não as altere. Proteja-as. Atravesse com elas o portal do milênio e as devolva a mim. Tenho algo para fazermos.”
As joias eram nada menos que certas plantas e fungos utilizados desde tempos ancestrais, como ferramenta de cura e êxtase visionário. Além do peiote, a cesta trazia o cipó amazônico ayahuasca, a raiz africana iboga e os cogumelos mágicos dos maias e astecas. Outra peça do quebra-cabeça começou, então, a se apresentar em uma frase mântrica que membros da comunidade Kayumari ouviam cochichar em seus ouvidos: “Quando as avós falarem… Quando as avós falarem…”
O que iria acontecer quando as avós falassem? Nenhuma daquelas pessoas sabia ainda, mas diferentes tribos americanas traziam na memória uma antiga profecia, que dizia mais ou menos assim: “Quando as avós das quatro direções falarem, uma nova era estará nascendo.”