segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

ESTE ANO É UM ZUMBI DE WALKING DEAD: GRUDENTO, INSISTENTE E NÃO MORRE - Leonardo Sakamoto

Eu já estou cansada deste 2014 e olhe que raramente me entedio com o passar dos dias. Que 2015 chegue logo cheio de complexidades totalmente previstas, apesar de ainda desconhecidas, mas sem os sustos que este 2014 nos proporcionou.


Leonardo Sakamoto

Você não tem a sensação de que chegam as Olimpíadas, mas não chega 31 de dezembro?
De que este ano valeu por uma década e foi possuído pelo Tinhoso?
Não sentiu que 2014 foi um grande “Ano da Marmota'', estrelado não por Bill Murray, mas por você?
E de que as palavras “cansaço'' e “saco cheio'' eram pertinentes para o mês de agosto, mas, para dezembro, o termo seria outro que ainda não foi cunhado?
Este ano é um zumbi de Walking Dead. Grudento, insistente e não morre.
Não tenho como explicar 2014 com palavras ainda. Preciso de mais tempo. Mas certamente ele não vai entrar para o meu anedotário como “o melhor ano da minha vida'', como uma amiga cravou dia desses, saltitante feito gazela, ao analisar os últimos 12 meses. Um dos mais intensos, talvez. O que não significa que tenha sido bom ou ruim.
Quando disse isso a ela, foi como o céu lhe desabasse sobre a cabeça. Ficou #xatiada. Afirmou que quem cultiva cinismo, colhe desgraça.
Mal sabe ela que os cínicos herdarão a terra.
Lembrei de uma discussão que já havia trazido aqui. Vivemos o final do ano, momento em que se convencionou ser de balanço do último período – ressalte-se o “convencionou''. Por isso, a quantidade de pessoas que se assusta com uma análise negativa ou neutra dita em público é grande. Parece que afirmar que este não foi, necessariamente, um ano bom significa que tudo foi horrível e que rastejamos feito lesmas catatônicas até o som do estouro da rolha de sidra do dia 31 de dezembro.
Aconteceram coisas boas, mas racionalizando – e na minha opinião – tudo foi muito pesado. Sem dúvida, 2014 será lembrado como um ano em que se gritou muito, mas se escutou pouco. Não foi o ano da perda da inocência, mas do pudor. Pudor de expor e defender em público nossos preconceitos, violências e anacronismos como verdades absolutas. É claro que um mundo sem máscaras é melhor do que aquele escondido no armário. Mas, não há como negar que, olhando para a internet, 2014 foi ano de perder a vergonha de fazer cocô de porta aberta em banheiro público.
É análise subjetiva, claro. Só que tem gente que não entende isso e tentam pasteurizar as experiências de vida. Quer que afirmemos que 2014 foi fantástico. Pois, não raro, precisam desse empurrãozinho coletivo para que possam acreditar nisso.
Creio que muitos se esforçam para ver tudo de um ponto de vista cor-de-rosa, negando o resto. E aí qualquer posicionamento mais crítico acaba sendo um ataque frontal ao mundo de fantasia criado para protegê-los de sua própria realidade. Quando se nega problemas, o crescimento que poderia decorrer da superação desse processo fica interditado.
Um conhecido ficou incomodado com uma mulher que chorava em público em época de final de ano. “Ai, ela não podia fazer isso em outro lugar?'' Se estivesse rindo, ele não se importaria tanto. Porque, em verdade, o problema não era ela, mas ele. E o esforço que ele fazia para ficar bem em sua vida complicada, com vergonha de que o mundo percebesse que as coisas não eram perfeitas.
O fato é que muita gente não quer pintar tudo de dourado. E sim viver determinado sentimento ou momento porque ele faz parte da existência ou ainda para poder superá-lo e não enterrá-lo nos descaminhos da memória.
Somos condicionados a, diante de algumas situações, tentarmos “salvar'' um semelhante. Ainda mais aqueles que não querem “fechar o ano com chave de ouro'' e “reabrir o próximo com muita luz''.
Mas quem disse que precisamos ser salvos?

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